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Opinião
O que é ser Indígena no Brasil
Scarlett Rocha
2021-04-20

Na primeira foto, um indígena vestido com uma camiseta estampada com a marca estadunidense Nike e a bandeira nacional ao fundo, na Praça dos Três Poderes. Na segunda foto, um indígena usa uma máscara estampada com a marca francesa Lacoste, enquanto está em uma dança com seu povo, em frente ao STF. Essas imagens suscitam um velho debate feito pela branquitude no Brasil, sobre o que pode ou não um indígena vestir.

Foto: Scarlett Rocha @scarlett_rocha

Foto: Scarlett Rocha @scarlett_rocha

Não são poucos os brancos que acreditam que a partir do momento que um indígena usa short Adidas, calça sandálias Havaianas, usa celular, tablet, anda de moto ou dirige uma Hilux, não pode mais ser considerado indígena. Essa ideia presente no imaginário social brasileiro, os coloca numa redoma (puros e imaculados), uma espécie de zoológico para podermos olhá-los e ver as suas diferenças como se fossem naturais, não construídas socialmente.

O exótico é o que chama a atenção. Por isso é lugar comum os meio de comunicação social mostrarem esses povos com determinados adereços, que são cocares, arco-e-flecha, casas de palha, sem roupa e assim por diante. E muitos fotógrafos tem culpa nisso porque ao registrar indígenas, trabalham com uma visão datada, retratando-os de um jeito que mais lembram quadros indianistas de algum membro da Expedição Langsdorff, feita no século XIX, como se os fotografados não fossem nossos contemporâneos e como se, ao fotografá-los, estivéssemos em uma máquina do tempo.

Essa percepção estética coloca o índigena no lugar de não-gente, não-humano, como nós, cuja imagem e pertencimento à categoria "índio" só possa ser validada se responder a determinados estereótipos. Mas também parte da mídia, muitas vezes comprometida com os interesses da exploração das riquezas dos territórios indígenas, a exibição do índio “corrompido", perambulando pelas cidades, bêbado, que deixa os filhos morrendo desnutridos porque "troca a sexta básica por pinga", o que contribui para a marginalização dos povos indígenas no Brasil e aprofunda o abismo entre esses povos e o que se pode chamar de sociedade brasileira. Fica a pergunta: um branco deixa de ser branco e vira índio porque come tapioca ou açaí?