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“Normalidade democrática não está consolidada no Brasil”

Em entrevista à DW, sociólogo português Boaventura de Sousa Santos afirma que crise é “terrível” para imagem brasileira, mas pode levar a uma reformulação e a uma refundação política do país.

Deutsche Welle Brasil
Fernando Caulyt
20 Mar 2016

Para o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, a atual crise política mostra que a normalidade do jogo democrático, que se pensava estar consolidada de maneira sustentável no Brasil, de fato não está.

Em entrevista à DW Brasil, ele afirma que a repercussão da atual instabilidade no momento é terrível para a imagem brasileira, mas pode ser positiva no futuro – desde que a Justiça consiga mostrar que não atua de modo seletivo.

“Se conseguir fazer isso, vamos ter uma reformulação e uma refundação política do Brasil. Como aconteceu na Itália, hoje a corrupção naquele país não tem o mesmo caráter endêmico como antes das Mãos Limpas”, opina Sousa Santos, doutor em sociologia pela Universidade de Yale (EUA) e diretor do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (Portugal).

DW Brasil: Como o senhor avalia o atual momento político no Brasil?
Boaventura de Sousa Santos: É uma crise muito grave, fundamentalmente porque a normalidade do jogo democrático, que se pensava estar consolidada de maneira sustentável no Brasil, de fato não está. As elites políticas conservadoras que dominaram durante praticamente todo o período histórico de Independência do Brasil não se conformaram com o fato de terem perdido as últimas eleições por uma pequena margem. É realmente pouco usual que, poucos meses após um presidente assumir, seja pedido o seu impeachment. Além disso, uma fração minoritária, mas importante do Poder Judiciário está ultrapassando e manipulando politicamente os seus poderes e cometendo ilegalidades que, aliás, estão sendo reconhecidas até mesmo pelos adversários políticos do ex-presidente Lula e do PT.

E as denúncias da Lava Jato envolvendo os nomes de Lula e Dilma?
É evidente que o PT e seus dirigentes cometeram muitos erros ao longo desses 12 anos. O PT cedeu, sobretudo a partir do segundo mandato de Lula, e governou à moda antiga, com outros objetivos, aquilo que sempre fizeram as elites oligárquicas conservadoras, o que é uma grande intimidade e promiscuidade entre o poder político e econômico. Se um governo de esquerda não protege essa elite conservadora e pode ter cometido alguns erros, isso tem um significado político muito forte: primeiro, porque a corrupção cometida pela direita e pela esquerda não é tratada de forma igual pelo Judiciário, e isso é assim no Brasil e na Europa. Essa dualidade de critérios é uma constante do sistema judiciário. O juiz Sergio Moro invoca a operação Mãos Limpas na Itália, mas invoca mal, porque na Itália a operação atuou contra toda a classe política: a esquerda e a direita.

Qual seria uma possível solução para a atual crise?
Tem que ser uma solução democrática. E não podemos ter uma situação de distensão como aquela que já está gerando uma divisão profunda do sistema judiciário e político. Muitos pensam que, neste momento, talvez fosse preferível que Dilma renunciasse, e o PT voltasse à oposição e se reconstruísse. A outra posição é aquela que está acertada, de Lula entrar para o ministério. Ele é um grande negociador, um grande político. Ele continua mostrando que, apesar disso tudo, ele está ainda na linha de frente para uma eleição em 2018. O Brasil é um país que está extremamente dividido. É um país menos injusto, que está mais equilibrado econômica e socialmente, mas mais desequilibrado politicamente, precisamente porque as classes dominantes que governaram o Brasil não admitem estar fora do poder por tanto tempo. E isso está condicionando o futuro político do Brasil.

E o senhor considera possível Dilma reverter a situação?
O impeachment, para ser concretizado, precisa ser provado atividade criminosa por parte da presidente durante seu mandato. E isso, até agora, não foi provado, há indícios. É muito difícil prever qual é a melhor solução, mas considero que a paz, por uma outra via, não vai chegar senão depois de um outro processo eleitoral em que a vitória de um candidato, de um lado ou de outro, seja inequívoca.

A nomeação de Lula como ministro foi uma jogada positiva para o governo?
A primeira impressão é que ele está fugindo de sua incriminação, mas, de fato, não está, porque o processo vai continuar no STF. Ele tem uma aptidão política que a Dilma nunca teve, e a grande culpa histórica de Lula foi propor a presidente Dilma. Foi uma jogada extremamente arriscada que tanto pode assegurar uma reconstrução da imagem de Lula como também pode destruí-la.

Quais são as consequências da Lava Jato para a imagem do Brasil no exterior?
São as mesmas consequências que tivemos na Itália durante as Mãos Limpas, em meados da década de 1990. Na época, o mundo olhou para a Itália e viu que o país era um antro da corrupção, porque todo o sistema político estava corrompido, da esquerda à direita. E, portanto, significou uma grande estruturação do sistema político que deu origem, no fundo, ao fenômeno Silvio Berlusconi, que também, como sabemos, não resolveu o problema. A Europa, com seu preconceito colonialista e de superioridade, já não se lembra do que aconteceu na Itália e vai considerar que o Brasil é um país de corrupção, onde as instituições não funcionam, porque esquecem facilmente do que acontece na Europa. A repercussão é terrível, mas ela será boa para o Brasil. Mas só com uma condição: que a Lava Jato realmente não seja seletiva.

Nomeação de Lula como ministro pode tanto recuperar sua imagem de Lula como também pode destruí-la.”

Quando protestam, os brasileiros parecem tratar a corrupção como algo inerente somente aos políticos…
A corrupção é endêmica nas sociedades de hoje, não apenas no Brasil. Veja o que está acontecendo em Portugal e na Espanha. A corrupção no Brasil e em outras sociedades que saíram do colonialismo sempre foi endêmica. O povo acabou por se habituar e havia um ditado muito frequente no Brasil do [hoje deputado federal Paulo] Maluf, que é o “rouba, mas faz”. Ou seja, certa condescendência e tolerância perante a corrupção. Essa corrupção vive de uma maneira endêmica em todo o sistema político brasileiro e não é de agora, há muito tempo. O que me choca é como ela aparece como sendo apenas de um partido ou setor político.

A Lava Jato poderá produzir uma mudança de comportamento nos políticos e na população?
Sem dúvida, mas se a Lava Jato for conduzida por juízes que não perdem a cabeça, que não entram em vingança ou justiça de justiceiro, isto é, sobrepõem a justiça pública sobre a privada. Se conseguir fazer isso, vamos ter uma reformulação e uma refundação política do Brasil. Como aconteceu na Itália, hoje a corrupção naquele país não tem o mesmo caráter endêmico como antes das Mãos Limpas. Pode ser que a curto prazo também vá dar origem a “Berlusconis” no Brasil, que já existem, e que certamente estão à espreita para se tornarem mais fortes, mas é evidente que ela vai realizar mudanças.

Há uma judicialização da política?
A judicialização da política é, obviamente, uma constante em muitos países e existe há muito tempo no Brasil e em outros países como a África do Sul. A judicialização da política é o outro lado da politização da justiça: isto é, quando as classes políticas utilizam os tribunais para resolver conflitos, os tribunais, ao resolvê-los, também se politizam. Essa tensão entre o Executivo e Judiciário é patente neste momento na Espanha, Itália e Portugal. se não ultrapassar um certo limite, é saudável. Obviamente, para muitos cidadãos, quando o Judiciário ultrapassa certo limite, ficamos com aquele problema que é o dilema das democracias modernas: o órgão de soberania, o único que não foi eleito pelo povo, determina a política. E isso é o que está acontecendo no Brasil.

As manifestações pró-impeachment alçaram, em vez de políticos, o juiz Sérgio Moro como herói. Há uma crise de representatividade no sistema político brasileiro?
Sem dúvida. Isso aconteceu exatamente na Itália. O Antonio Di Pietro, que foi o grande magistrado das Mãos Limpas na Itália, obviamente foi considerado por um tempo como herói e entrou na política, e formou um partido. Portanto, nada do que está acontecendo no Brasil é assim tão excepcional. Nós é que não conhecemos bem a história da Europa, temos uma capacidade de amnésia enorme e, portanto, tentamos ver os países do terceiro mundo, da América Latina e da Ásia como aqueles onde essas anomalias sempre acontecem. Isso ocorre e tem ocorrido na Europa e não me surpreenderia se o juiz Sergio Moro, amanhã, for recrutado por um partido, obviamente da direita e fosse candidato à Presidência da República. Eu não ficaria surpreso.

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