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“Vivemos ainda sob a lógica do colonialismo”

“Seu pensamento nos ilumina; sua ação nos anima”. Assim o diretor geral da III BIENAL BRASIL DO LIVRO E DA LEITURA, Nilson Rodrigues, saudou o escritor português Boaventura de Sousa Santos, na noite de quinta (27) em cerimônia de entrega do troféu Bienal ao homenageado internacional do evento em 2016.

III Bienal Brasil do Livro e da Literatura
28 Oct 2016

Boaventura de Sousa Santos (Foto: Hugo Paiva)

O Deputado Distrital Chico Vigilante reforçou: “Fiquei emocionado ao apertar a mão de um verdadeiro cidadão do mundo, que se preocupa com populações do mundo todo”. Em seguida, o talento de poeta de Boaventura foi apresentado por Hamilton Pereira, também conhecido como o poeta Pedro Tierra, um dos curadores da BIENAL. “A poesia de Boaventura não é derramada; é enxuta”, avisou Hamilton, que declamou alguns poemas do homenageado.

Uma das principais vozes em favor da democracia e do fim das desigualdades no planeta, Boaventura conquistou a plateia que lotou o Auditório Nelson Rodrigues logo nas primeiras palavras, avisando: “Embora o Brasil esteja vivendo um momento delicado, nosso otimismo trágico nos leva a ir em frente”, disse, referindo-se a sua teoria de que, embora as dificuldades sejam enormes para a construção de uma sociedade mais justa, elas não são tão inelutáveis que possam eliminar a possibilidade de alternativas.

Boaventura de Sousa Santos confessou que o tema que escolheu para falar durante a homenagem – Os Movimentos forçados de populações e os desafios à Democracia – não é tão frequente em suas palestras. Mas o considera tão essencial para a compreensão dos desafios da democracia no mundo atual, “que vive uma crise sem precedentes”, que decidiu abordá-lo. Como sempre, o fez brilhantemente.

Para começar, o grande pensador avisou que “nossas crises são quase sempre menos novas do que pensamos”, alertou, lembrando os grandes deslocamentos provocados no passado, como o tráfico de escravos (“três milhões de escravos morreram na travessia do Atlântico”), a imigração de mais da metade da população norueguesa para a América do Norte no século XIX, os imigrantes que fugiram da Primeira e da Segunda Guerras Mundiais, dentre outros. “50 milhões de europeus deixaram suas terras no século XX”, afirmou.

Segundo defende Boaventura, vivemos no mundo da desinformação. Ele diz: “A mídia está criando a sociedade das ausências. Os fatos ocorrem, mas é como se não tivessem existido porque ninguém fala dele”, disse o professor, enfatizando: “há milhões de deslocamentos em várias partes do mundo, mas a Europa e os Estados Unidos dramatizam só o que acontece com eles. Na África, há 4,9 milhões de refugiados hoje, que circulam pelo continente, fugindo da violência em seus países. Só da Nigéria, são 1,4 milhões de refugiados. Hoje, uma a cada 122 pessoas está em deslocamento no planeta, tendo que sair de sua terra. Mas ninguém sabe, porque a mídia não fala disso”. Boaventura lembrou ainda os deslocados internos do Brasil, como os agricultores expulsos pela seca, pelo agronegócio, pela mineração, pela violência contra os povos indígenas.

Como contraponto a esta situação, o sociólogo sugere uma “escuta profunda”, que propõe ouvir para entender, ouvir o que não se diz, o que a história não fala, o que não tem voz, mas o que existe, “se deixar transformar pelo sofrimento e também pela alegria”. Só assim, diz Boaventura, se tem acesso a uma justiça histórica, que analisa os fatos do presente sem perder de vista o passado que os levou a isso. “Antes de serem um problema, foram a solução para alguém”, lembra. Explicando que, se hoje a Europa vive a crise dos imigrantes sírios, que fogem da destruição de seu país e são lançados em verdadeiros infernos como a já famosa Selva de Calais, deve-se aos interesses das grandes potências nos recursos naturais da Síria, por exemplo. “Só não acabaram com a Síria tão rápido como foi com a Líbia de Kadafi, que também tinha se recusado a ceder às pressões econômicas desejosas de se apoderar dos recursos naturais de seu país, porque a Rússia interferiu”, explica.

Ouvindo Boaventura de Sousa Santos, o espectador vai compondo um quadro mais claro do tão complexo panorama social e político mundial. Com uma fala clara, direta, o professor oferece dados, relembra fatos, ilumina questões que estão entre as mais urgentes do mundo contemporâneo. “Vivemos ainda sob um sistema capitalista, colonialista e de patriarcado, que trata as pessoas como sub-humanas, não-humanas, paisagens. O racismo só existe numa lógica colonial, para a qual o explorado não tem a mesma dignidade do explorador. O extermínio de jovens negros nas nossas cidades do mundo todo parte de uma lógica colonial. Mas os escravos foram uma solução durante muito tempo, não é?”

Também oferecendo exemplos desta “lógica colonialista”, Boaventura questionou: “Depois de tantos anos de movimento feminino as mulheres continuam a ser violentadas? Como isso pode estar acontecendo”. E citou o ocorrido na Argentina há pouco tempo, quando as mulheres decidiram fazer uma greve de uma hora. “A Argentina parou”, contou o professor, provocando: “Imagina se as mulheres resolvem fazer uma greve de uma semana em todos os países? Dariam uma prova da importância feminina e isso poderia mudar um pouco as coisas, não?”

Segundo defende o sociólogo, a democracia atravessa um momento de mudança de paradigma. Diz ele: “A democracia considera que as pessoas não se movem, trabalha com o conceito de nação. Então, os deslocados estão fora dos conceitos democráticos. O neoliberalismo não vê mais países e sim mercados de uma economia global. As guerras são decorrentes da voracidade de acesso aos recursos naturais. A democracia vive em crise com o capitalismo, mas ela perdeu essa guerra. Porque para a democracia é preciso paz”. E o grande pensador encerrou sua fala dando um conselho ao espectador: “O perigo hoje é global, por isso, é preciso mais do que nunca uma escuta profunda”.

CIDADÃO DE BRASÍLIA – No dia seguinte a sua palestra, Boaventura de Sousa Santos recebeu o título de Cidadão Honorário de Brasília, em solenidade realizada na manhã de sexta-feira (28), no Auditório Nelson Rodrigues da III BIENAL BRASIL DO LIVRO E DA LEITURA, que contou com a presença de parlamentares, diplomatas, escritores e público em geral.

Dizendo sentir-se em casa em Brasília (ele já detém o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Brasília), Boaventura mais uma vez encantou a plateia, com um discurso fluido e de rara lucidez: “A racionalidade é uma razão quente. É estupidez distinguir razão e emoção. Falo com o coração. Sinto-me com o coração quase a ferver”, declarou. E confessou: “Nesse cosmopolitismo subalterno, que este dos que lutam pelos movimentos sociais no mundo, sinto-me muito honrado”.

O sociólogo, novamente, fez um discurso exaltando a democracia e a necessidade de não abandonar a luta em favor desta. “Portugal é hoje o único governo de esquerda na Europa, mas estamos sob a ameaça fascista”, alertou, lembrando o que fez a União Europeia com a Grécia: “Eles obrigaram um governo socialista a adotar um governo de direita”. Para Boaventura, “ser europeu hoje é ser de direita”. Então, diz o escritor, poeta, professor, o momento é de juntar forças e reinventar as esquerdas: “Enterraram, mas não sabiam que éramos sementes. E a semente que foi enterrada um dia floresce”.

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