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Ópera Rap Global exercita “ecologia de saberes” na prática

“A raiva é a saliva da alma. A raiva é a saliva da alma. A raiva é a saliva da alma…” Emanadas da boca do rapper Renan Lélis, do grupo Inquérito, as frases parecem nunca mais acabar. Elas “colam” nos ouvidos do público espectador e traduzem o sentimento engasgado de indignação representado pelo personagem Queni N. S. L. Oeste, jovem migrante de Angola e morador da periferia de Lisboa, protagonista do livro Rap Global, que reúne rimas de autoria do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos.

Maurício Hashizume
Equipa ALICE

A parceira entre Renan e Boaventura (roteiristas), juntamente com um coletivo diverso de jovens artistas do Brasil que deve se reunir em torno do Instituto Trocando Ideia (Tr.I.), de Porto Alegre (RS), está fazendo com que essa história – que simboliza o turbilhão de injustiças sofridas pelos “Quenis” em todo o mundo – vá mais além: está virando uma ópera. Lançado na última sexta-feira (13) em apresentação transmitida ao vivo pela internet, o projeto Ópera Rap Global encara o complexo desafio de combinar os movimentos e manifestações “de rua” do hip-hop com expressões artísticas consideradas eruditas, como a música clássica.

À frente da iniciativa pelo Tr.I., Fabiana Menini ressalta que o Ópera Rap Global se inspira fortemente na concepção de “ecologia de saberes”, da lavra do próprio Boaventura, e vem sendo trabalhado há cerca de dois anos. Esse esforço conjunto fez com que o projeto conseguisse aprovação junto a uma lei brasileira de incentivo (conhecida como Rouanet) que abre a possibilidade para que empresas apoiem projetos culturais mediante isenção de impostos. A partir deste lançamento ocorrido em meados de setembro de 2013, portanto, realizar-se-á uma intensa campanha de captação de recursos para que a proposta seja apresentada em seu formato final (com todos atos, músicas, intervenções etc.), conforme planejamento inicial, em abril de 2014.

Logo que a quantia necessária for recolhida, a entidade promete abrir uma seleção pública para a contratação de cerca de 40 artistas, que contarão com o suporte de uma ampla produção – a qual inclui, entre outras etapas, a montagem de cenários e coreografias, bem como aulas de canto e de interpretação teatral. “Teremos inclusive uma fase de formação que tratará de temas conceituais sobre a obra do professor Boaventura, que busca romper fronteiras”, completa Fabiana.

Na mensagem gravada em vídeo que foi transmitida durante o lançamento, Boaventura lembrou justamente que a obra Rap Global evidencia sentimentos que não cabem no “discurso sociológico”, notadamente “cheio de notas de rodapé”. Trata-se, segundo ele, de uma manifestação que busca denunciar os massacres diários sofridos pela gente oprimida no mundo – seja por mulheres, pelas pessoas do campo, por povos indígenas, pela população negra ou por migrantes. Pelas mãos de DJs e MCs sob a direção musical de Tonho Crocco, da mesma cidade de Porto Alegre, o livro (que guarda ligação com a obra do escritor angolano Manoel Rui) já tinha se convertido em música (confira vídeos aqui, aqui e aqui).

O que já tinha se tornado música será, agora, convertido em outra expressão cultural. “Por que não ocupar a ópera?”, provocou o professor da Universidade de Coimbra, que realçou ainda que a mesma se tornou uma “modalidade celebratória da burguesia” e que a “heresia” por trás da iniciativa é bem-vinda. Essa transgressividade faz com que a proposta seja também parte do Projeto ALICE – Espelhos Estranhos, Lições Imprevistas, apoiado pelo Conselho de Pesquisa Europeu (ERC) e coordenado pelo próprio professor Boaventura.

A superação de fronteiras da Ópera Rap Global não se resume apenas ao seu conteúdo. Renan Inquérito, que assina o roteiro da Ópera Rap Global junto com Boaventura, concluiu o mestrado em Geografia na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) com uma dissertação sobre a heterogeneidade do movimento hip-hop em distintas regiões brasileiras. Ao todo, 15 letras de rap prontas para o espetáculo. Renan afirma que aceitou prontamente o convite para a empreitada inclusive porque já conhecia e se valera, no campo acadêmico, do trabalho de Boaventura que, segundo ele, tem muitas aproximações com os escritos do geógrafo brasileiro Milton Santos. O rapper, que vive no interior do Estado de São Paulo e faz apresentações com o Inquérito pelo país, teve três encontros pessoais com o professor Boaventura – no Rio de Janeiro (RJ), em Brasília (DF) e em Porto Alegre (RS) – para se aprofundar na obra do sociólogo português com vistas a moldar o enredo, pontuar dramaticidades e dar vida a novos personagens.

O músico Pedro Dom, responsável pelas composições e pela condução da “mini-orquestra” que fará parte da Ópera Rap Global, também é rapper em Novo Hamburgo (RS), município da Grande Porto Alegre. De acordo com ele (que vem associando colegas da orquestra sinfônica da sua cidade com músicos de outras formações), o processo vem sendo guiado fortemente pela noção da força da diversidade entre as “escolas do Norte e do Sul” contida na “tradução intercultural”, presente em Boaventura. A chamada música clássica “ocidental” – e alguns de seus “representantes” mais notórios, como Bach, Beethoven e Mozart – amplia as possibilidades (com suas estruturas, formas e frases) para experimentações e “reviravoltas”. Já a polirritmia africana, com sua extrema complexidade – na qual uma pessoa faz a célula rítmica principal e as outras “acompanham” por uma lógica própria, muitas vezes no “improviso”, que ocorre similarmente em jam sessions de jazz - tem balanço e suingue. “E, com o rap, temos aquela sensação quase instintiva de vontade de nos mexer”, emenda. “O desafio de compor uma ópera, nessas bases, é imenso”.

Além dos músicos e de Renan Inquérito, o lançamento da Ópera Rap Global, realizado no Museu Júlio de Castilhos, contou com uma performance de dança e representação de matriz africana por parte da atriz Aline Ferraz. A direção artística não só da referida apresentação, mas de todo espetáculo, está a cargo de Renan Leandro, que tem experiência em teatro de rua. Além da Ópera Rap Global, o Instituto Trocando Ideia, formado há 17 anos com o intuito de criar espaços de manifestação para o movimento hip-hop na capital gaúcha, desenvolve atualmente diversas outras ações na área de cultura e comunicação social – envolvendo rádios e associações comunitárias, escolas e intervenções no mobiliário urbano, em diversos pontos do Rio Grande do Sul. Mantém ainda, conforme destaca Fabiana, estreita relação com movimentos sociais urbanos como os de luta pela moradia.

Um dos presentes no lançamento foi o ex-deputado federal Tarcísio Zimmermann (PT-RS), que atualmente preside a Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan). Segundo ele, a empresa pública decidiu apoiar a iniciativa por conta da importância do incentivo a projetos que estejam fora do circuito mainstream e que valorizam a heterogeneidade frente à tendência de “hegemonização massificada”. Essas “ocupações musicais”, segundo ele, são cruciais para se romper a concepção de que existem espaços musicais e sociais estanques.

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